Madre Teresa tinha amor pela pobreza, não pelos pobres, afirma Hitchens.

jan 6, 2016 by

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O ano de 2016 marcará para os católicos de todo o mundo o ano da canonização de um dos maiores ícones da Igreja Católica no século 20 – a madre Teresa de Calcutá. Sua canonização, no entanto, não é unanimidade. Ainda na década de 1980, a religiosa foi acusada, pela primeira vez, de má utilização de doações e fundamentalismo religioso.

Os ataques à madre Teresa começaram na década de 1980, logo após a religiosa ter sido agraciada com o Prêmio Nobel da Paz de 1979. Na cerimônia de entrega do prêmio, em Oslo, a madre Teresa condenou o aborto: “o maior destruidor da paz, hoje, é o choro da criança inocente, não nascida”, discursou. “Se uma mãe pode assassinar o seu próprio filho, no seu próprio útero, o que sobrou para você e para mim? Nos matarmos uns aos outros”.

O primeiro ataque surgiu na Grã-Bretanha, num artigo da jornalista Barbara Smoker, intitulado “Madre Teresa: a vaca sagrada?”, questionando a atitude da mídia ocidental, que parecia considerar a religiosa imune a qualquer espécie de crítica. Smoker, num texto marcadamente liberal e feminista, alega a falta de visão da madre Teresa, quando a população de miseráveis na Índia aumentara em mais de cem milhões em apenas uma década.

“Morando em Calcutá”, escreveu Smoker, “a madre Teresa vê diariamente o sofrimento causado pela superpopulação. Mesmo assim, recusa-se a aceitar qualquer tipo de planejamento familiar, como o controle de natalidade, ao invés do controle da mortalidade”.

Smoker, porém, soube ver alguns aspectos positivos no trabalho da religiosa: “Ela é, certamente, uma mulher impressionante, um caloroso ser humano, transbordando de sentimentos maternais”. Tarde demais. O seu artigo abrira a porteira para que outros jornalistas, mais ou menos céticos, também atirassem a sua pedra. O mais proeminente de todos eles, que deu início a uma verdadeira cruzada anti-Madre Teresa, foi o anglo-americano Christopher Hitchens.
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Em 1995, Hitchens lançou o livro “A Posição do Missionário: Madre Teresa em teoria e prática”, até hoje o mais virulento e bem documentado ataque contra a religiosa e sua obra. Nele, o autor a retrata como “uma figura consistentemente reacionária”, por suas boas relações com Margareth Thatcher e Ronald Reagan, além de ter visitado a Nicarágua, dando apoio aos “contras” na guerra civil contra os sandinistas.

Pior, Hitchens revela as doações aceitas pela Madre Teresa de Calcutá de regimes ditatoriais, como o de Baby Doc, no Haiti, e do milionário norte-americano Charles Keating, condenado por estelionato.O livro de Hitchens questiona ainda ação do Lar dos Moribundos, onde a Madre Teresa começou a sua missão, e das Missionárias da Caridade, a organização fundada pela religiosa na década de 1960.
“(…) Onde foi parar o dinheiro, e todas as outras doações? Seu precário hospital em Calcutá estava tão decadente, quando ela morreu, quanto havia sempre sido – ela mesma, quando ficava doente, preferia as clínicas da Califórnia –, e a sua instituição de caridade sempre se recusou a publicar qualquer auditoria. Enquanto isso, ela mesma dizia ter fundado mais de 500 conventos em mais de cem países, todos sob o nome da sua própria instituição. Perdoe-me, mas se pode chamar isso de modéstia e humildade?”, questiona o jornalista.
“Madre Teresa não era amiga dos pobres”, conclui Hitchens. “Era amiga da pobreza. Ela defendia que o sofrimento é uma dádiva de Deus. Ela opôs-se, durante toda a sua vida, à única cura conhecida para a pobreza: o fortalecimento da mulher e a sua emancipação do seu papel, livrando-as de uma versão de gado, de reprodução compulsória”.

Médicos de organizações independentes testemunharam que nos ‘hospitais” mantidos pela madre Teresa os pacientes não recebiam tratamento adequados. Os doentes ficavam no chão, em cima de uma esteira. Não havia cuidados com a higiene e as agulhas eram reutilizadas sem esterilização. Eles, incluindo os terminais, não recebiam remédios para dor porque a madre acreditava que o sofrimento os aproximava de Deus.
A madre Teresa deverá ser canonizada pelo Papa Francisco no dia 4 de setembro de 2016. O papa, que a conheceu durante um sínodo em Roma, em 1994, disse ter ficado impressionado com a religiosa e, de bom humor, confessou: “Eu teria medo que ela fosse a minha madre superiora”.
Assista a seguir o documentário de Christopher Hitchens, sobre madre Teresa de Calcutá