Congresso uruguaio aprova legalização do aborto

out 22, 2012 by

MONTEVIDÉU — Após uma sessão de cinco horas, o congresso uruguaio aprovou nesta quarta-feira, por uma pequena margem de diferença, uma lei que permite o aborto durante as primeiras 12 semanas de gestação, tornando-se o terceiro país da América Latina a legalizar a interrupção da gravidez. A lei determina que cidadãs uruguaias que queiram pôr fim à gravidez nesse período sejam submetidas a um comitê formado por ginecologistas, psicólogos e assistentes sociais, que lhe informarão sobre riscos e alternativas ao aborto. Se a mulher desejar prosseguir com o procedimento mesmo assim, poderá realizá-lo imediatamente em centros públicos ou privados de saúde.

A norma – que recebeu 17 votos a favor e 14 contra no Senado – havia sido aprovada na Câmara dos Deputados em setembro. Na época, o Partido Nacional foi o único que manteve a integridade no que foi acordado com seus deputados. Todos votaram contra o projeto e disseram que, se o presidente José Mujica aprovasse a norma, iriam promover um referendo popular sobre a polêmica. Mujica, por sua vez, já anunciou que a lei será promulgada. Em 2008, o então presidente Tabaré Vázquez vetou uma iniciativa similar aprovada pelo Congresso.

A nova lei também permitirá o aborto em casos de riscos à saúde da mulher, de estupros ou de má-formação fetal, até 14 semanas de gestação. O Congresso uruguaio ainda discute dois temas polêmicos: a legalização do consumo da maconha e o casamento entre homossexuais.

- Com esta lei entramos no rol dos países desenvolvidos que, em sua maioria, adotaram critérios de liberação do aborto, reconhecendo o fracasso das normas penais que tentaram evitar a interrupção da gravidez – disse o senador oficialista, Luis Gallo, durante a sessão.

Uma pesquisa recente da consultoria Cifra indica que 52% dos uruguaios são favoráveis à despenalização, e 34%, contrários. Mesmo assim, a tensão acerca da iniciativa já era vista no próprio plenário do Senado. Enquanto nas galerias, antes da votação, defensores da medida aplaudiam as explanações dos oradores, a oposição protestava, colérica.

- Não vamos compactuar com isso. Somos do partido da liberdade e da defesa dos direitos humanos. É um projeto centralista, de escritório, impraticável – atacou o senador Jorge Larrañaga, do opositor Partido Nacional.

Ele fez, ainda, um apelo à população uruguaia:

- Conto com a confiança dos cidadãos para governar a partir de 2015, quando vamos derrubar esta lei.

Outro opositor do Partido Nacional, o deputado Pablo Abdala, foi mais longe e disse que a legenda vai trabalhar pela convocação de um referendo popular sobre o tema. E prometeu que, em um ano, vai conseguir as assinaturas de 25% dos colegas para tal.

- Uma decisão dessa magnitude não pode ficar nas mãos de uma maioria ocasional, por maior que seja. Deve ser submetida ao veredito popular – alfinetou.

Protestos dos dois lados

Organizações não governamentais protestaram em frente ao Senado. Também houve resistência entre grupos favoráveis, como o “Coordenação pelo Aborto Legal”, que veem “exigências demasiadas” para a interrupção da gravidez. Espera-se que Mujica sancione rapidamente a lei despenalizando o aborto de fetos saudáveis – permitido na América Latina, além de Cuba, apenas na capital mexicana.

Entre 1934 e 1938, o aborto foi legal no Uruguai. E, desde a reabertura democrática, em 1985, todas as legislaturas apresentaram projetos a respeito.

- Sentimos que se trata de uma questão de direito, estamos convencidos de que se deve continuar com a luta pela autonomia da mulher – disse à BBC Brasil a senadora Monica Xavier, presidente da Frente Ampla.